terça-feira, 20 de abril de 2010

São Jorge, um feriado de crioulo doido

Na próxima sexta-feira, dia 23 de abril, todo o povo do Rio de Janeiro vai ter mais um dia inteirinho para descansar do feriado de Tiradentes, celebrado apenas dois dias antes: nós, ditosos cariocas, estaremos comemorando o Dia de São Jorge, patrono dos Exércitos.

Será que alguém aí saberia dizer desde quando e por que cargas d'água este feriado em homenagem ao santo guerreiro  passou a fazer parte do nosso calendário oficial? Eu, sinceramente, duvido muito. Já fiz esta pergunta a diversos amigos e nenhum deles conseguiu me apresentar uma explicação satisfatória.

Pois bem. Poupem-se do esforço de memória. Vou relembrar o caso aqui para vocês. A história do feriado deste tribuno militar do império romano que viveu no século IV e que hoje pode ser visto combatendo o dragão na superfície da lua, é quase tão absurda quanto a lenda que se criou em torno do santo.

Muito pouco se conhece sobre a vida de São Jorge, mas acredita-se que tenha lutado contra a perseguição dos primeiros cristãos na Europa. Hoje é patrono da Inglaterra, de Portugal, da Catalunha, da cidade de Moscou e de outras localidades do planeta. Mas foi aqui em Pindorama, onde se brinca o melhor Carnaval do mundo, que o santo guerreiro se associou à imagem da lua, por influência dos rituais religiosos dos escravos africanos. E aí a história do santo virou  samba enredo de crioulo doido:  São Jorge se confundiu com Ogum, cavalgou para fora das igrejas católicas e tomou conta dos terreiros de umbanda. Saravá, meu pai.

Como fruto de uma decisão política perfeitamente constitucional, o feriado parece mais inacreditável ainda. A idéia foi proposta como projeto de lei em 2001 por um vereador do Partido dos Trabalhadores chamado Jorge (que outro nome poderia ter o ilustre representante popular?) Babu - policial civil que então cumpria seu primeiro mandato, devoto de São Jorge e umbandista convicto.

Até aí, tudo bem. Democracia é isso, "duela a quien duela". Mas os absurdos políticos surgem em seguida, no processo democrático da votação do projeto de lei. Vejam só a rapidez com que se aprovou a criação deste feriado no Rio de Janeiro:

1) Em fevereiro de 2001, o vereador Jorge Babu submete a proposta ao Legislativo municipal em caráter de urgência, como se a nossa cidade não tivesse nada mais importante para decidir.

2) O prefeito do Rio, Cesar Maia, que de acordo com a lei tinha até quinze dias para opinar sobre a proposta, declara que é devoto do santo e que prefere ficar calado sobre a questão.

3) A lei é promulgada pelo Legislativo por decurso de prazo e, já a partir do ano seguinte (2002), ganhamos mais um feriado oficial na cidade: 23 de abril, Dia de São Jorge.

Um fato curioso na votação foi que os vereadores nem precisaram se mexer de onde estavam para aprovar a lei: definiu-se que aqueles que permanecessem sentados estariam votando a favor. (Em entrevista à imprensa, um dos vereadores disse depois que nem tinha percebido que havia votado, porque não conseguia ouvir direito o que se dizia no microfone da sala!)

E o enredo da história continua: Jorge Babu foi reeleito em 2004, ano em que foi preso pela Polícia Federal juntamente com Duda Mendonça, o ex-marqueteriro do presidente Lula, numa rinha de galos, atividade considerada crime ambiental no Brasil.

Sempre pelo PT, Jorge Babu é eleito deputado estadual em 2006. O feriado de São Jorge, que era municipal, passa a estadual.

O deputado é acusado de chefiar um grupo de milícias que comandam algumas favelas da zona oeste do Rio de Janeiro. Em 2008, Jorge Babu é denunciado pelo Ministério Público por formação de quadrilha e extorsão e, em janeiro de 2009, é expulso do Partido dos Trabalhadores.

Mas - atenção, eleitores! - o santo do ex-deputado é forte. Babu já conseguiu se filiar a outro partido, o obscuro PTN (Partido Trabalhista Nacional) e ainda este ano voltará a disputar eleições. Vale lembrar que o irmão dele, Elton Babu, segue cumprindo seu mandato de vereador do Rio de Janeiro pelo PT.

Em ano eleitoreiro, de vez em quando é bom a gente parar e refletir um pouco sobre o passado recente dos nossos legítimos representantes e candidatos.

Mas enquanto o dia do escrutínio não vem... aproveitemos bem os próximos feriados de Tiradentes (quarta-feira) e São Jorge (sexta). Aos felizardos que conseguirem enforcar a quinta-feira de trabalho bem no meio das duas efemérides, desejo um bom feriadão.

E que todos os santos ajudem o nosso Rio de Janeiro, amém.

Um comentário:

Anônimo disse...

Bom dia.
Vai rolar dia 08/03/11, terça, às 10:00hs, no largo da carioca a BANDA DO JORGE. Conto com vcs.
Abraço