sexta-feira, 30 de abril de 2010

Minha filha está chegando

A essas horas minha filha está a bordo de um avião, a 35 mil pés de altitude, em algum lugar na imensidão do céu entre a cidade canadense de Toronto e o Rio de Janeiro. Faz seis meses que a gente não se vê. Ela resolveu tirar uma semana de férias para matar um pouco as saudades do nosso Brasil, país onde nasceu e viveu toda a sua infância e parte da adolescência. Agora faltam só algumas horas para ela chegar aqui deste lado de baixo do Equador. Estou me preparando para dormir, feliz da vida, sabendo que amanhã cedo estarei diante do portão de desembarque internacional do aeroporto do Galeão procurando no meio dos passageiros aquele rosto risonho e querido, como tantas vezes fiz desde que ela se mudou do Brasil há dezesseis anos.

Foram anos enriquecedores para todos nós, de muitas mudanças e andanças por este mundo afora. Mas, como tudo na vida, paga-se um preço por isso. É difícil contabilizar as perdas e os ganhos de uma família globalizada. Com tantas idas e vindas, viagens, descobertas, novos amigos, novos idiomas e incontáveis separações e reencontros, o que mais nos faz falta hoje como família é o simples aconchego do dia a dia com nossos filhos. Nada de hora marcada, nem grandes celebrações, apenas a sensação reconfortante de se saber aceito e amado, de cuidar do cotidiano com simplicidade, como se a possibilidade da gente conviver no mesmo fuso horário fosse a coisa mais natural do mundo.

Agora vou dormir e sonhar com o luxo que me espera amanhã na porta do desembarque internacional do Galeão.

sábado, 24 de abril de 2010

Ladrões de figurinhas


Saiu na primeira página do jornal esta semana: cinco homens armados invadem a distribuidora das figurinhas da Copa do Mundo em Santo André (SP) e levam mais de 135 mil cromos.

Tive que ler e reler o texto algumas vezes para me certificar de que  era aquilo mesmo que o jornal queria dizer.  Fiz as contas por alto: cada pacote de figurinhas é vendido na banca de jornal por 75 centavos,  portanto o valor total do roubo deve chegar a pouco mais de R$ 20 mil.

A pergunta que não me sai da cabeça é: que tipo de homens seriam esses que, com armas de fogo na mão, são capazes de ameaçar outras pessoas de morte e arriscar as próprias vidas para roubar figurinhas com fotos de jogadores de futebol?

Poucas horas depois do roubo, surgem as primeiras migalhas de informações sobre os ladrões. A polícia descobre numa favela caixas com os tais pacotes de figurinhas, escondidas embaixo de camas onde duas jovens mulheres dormiam. Elas são logo detidas, bem como um funcionário da empresa distribuidora, que havia planejado o crime - todos na faixa de 20 anos de idade.

Que tipo de infância roubada teriam tido eles?

Em tempos não muito remotos, álbum de figurinha era assunto de interesse exclusivo de crianças, no máximo de adolescentes ou jovens adultos imaturos.

Penso nos álbuns que tanto me fizeram sonhar quando criança. A sensação de abrir cada pacotinho e torcer para encontrar as figurinhas "certas", como aquelas que completavam uma página inteirinha - que felicidade! -, me parece hoje impossível de se reviver.

Os temas dos álbuns eram então de uma inocência quase inacreditável, como a vida triste e piedosa do menino órfão em Marcelino Pão e Vinho.

Temas considerados "educativos" também tinham sucesso garantido, como animais selvagens, as maravilhas do espaço sideral e a história dos meios de transporte.

E tinha ainda aquelas figurinhas que vinham dentro da embalagem de papel que envolvia os chicletes Ping Pong. Mas a qualidade gráfica não era lá grande coisa.  Além do mais, mesmo com a inocência do nosso olhar infantil, éramos capazes de perceber o óbvio sentido comercial da coleção do chiclete.

Bom mesmo era colecionar as figurinhas dos álbuns de Walt Disney. Os personagens da turma do Mickey Mouse, Pateta, Pato Donald e Pinóquio  passeavam com desenvoltura pelo nosso imaginário infantil.

Mas nenhuma emoção se comparava à que a gente sentia com as figurinhas dos grandes clássicos dos estúdios Disney, como as histórias da Bela Adormecida e da Branca de Neve. A glória suprema era encontrar figurinhas difíceis, como as da cena do beijo do príncipe encantado, bem no finalzinho do álbum. As danadas eram quase impossíveis da gente encontrar dentro dos pacotinhos selados, que a gente rasgava bem devagarinho, prolongando ao máximo aquele momento de agonia e felicidade refreada, nos nossos corações de criança.


E volto a pensar com tristeza nos ladrões de figurinhas, 
cuja infância lhes foi roubada pelas injustiças da vida.


































terça-feira, 20 de abril de 2010

São Jorge, um feriado de crioulo doido

Na próxima sexta-feira, dia 23 de abril, todo o povo do Rio de Janeiro vai ter mais um dia inteirinho para descansar do feriado de Tiradentes, celebrado apenas dois dias antes: nós, ditosos cariocas, estaremos comemorando o Dia de São Jorge, patrono dos Exércitos.

Será que alguém aí saberia dizer desde quando e por que cargas d'água este feriado em homenagem ao santo guerreiro  passou a fazer parte do nosso calendário oficial? Eu, sinceramente, duvido muito. Já fiz esta pergunta a diversos amigos e nenhum deles conseguiu me apresentar uma explicação satisfatória.

Pois bem. Poupem-se do esforço de memória. Vou relembrar o caso aqui para vocês. A história do feriado deste tribuno militar do império romano que viveu no século IV e que hoje pode ser visto combatendo o dragão na superfície da lua, é quase tão absurda quanto a lenda que se criou em torno do santo.

Muito pouco se conhece sobre a vida de São Jorge, mas acredita-se que tenha lutado contra a perseguição dos primeiros cristãos na Europa. Hoje é patrono da Inglaterra, de Portugal, da Catalunha, da cidade de Moscou e de outras localidades do planeta. Mas foi aqui em Pindorama, onde se brinca o melhor Carnaval do mundo, que o santo guerreiro se associou à imagem da lua, por influência dos rituais religiosos dos escravos africanos. E aí a história do santo virou  samba enredo de crioulo doido:  São Jorge se confundiu com Ogum, cavalgou para fora das igrejas católicas e tomou conta dos terreiros de umbanda. Saravá, meu pai.

Como fruto de uma decisão política perfeitamente constitucional, o feriado parece mais inacreditável ainda. A idéia foi proposta como projeto de lei em 2001 por um vereador do Partido dos Trabalhadores chamado Jorge (que outro nome poderia ter o ilustre representante popular?) Babu - policial civil que então cumpria seu primeiro mandato, devoto de São Jorge e umbandista convicto.

Até aí, tudo bem. Democracia é isso, "duela a quien duela". Mas os absurdos políticos surgem em seguida, no processo democrático da votação do projeto de lei. Vejam só a rapidez com que se aprovou a criação deste feriado no Rio de Janeiro:

1) Em fevereiro de 2001, o vereador Jorge Babu submete a proposta ao Legislativo municipal em caráter de urgência, como se a nossa cidade não tivesse nada mais importante para decidir.

2) O prefeito do Rio, Cesar Maia, que de acordo com a lei tinha até quinze dias para opinar sobre a proposta, declara que é devoto do santo e que prefere ficar calado sobre a questão.

3) A lei é promulgada pelo Legislativo por decurso de prazo e, já a partir do ano seguinte (2002), ganhamos mais um feriado oficial na cidade: 23 de abril, Dia de São Jorge.

Um fato curioso na votação foi que os vereadores nem precisaram se mexer de onde estavam para aprovar a lei: definiu-se que aqueles que permanecessem sentados estariam votando a favor. (Em entrevista à imprensa, um dos vereadores disse depois que nem tinha percebido que havia votado, porque não conseguia ouvir direito o que se dizia no microfone da sala!)

E o enredo da história continua: Jorge Babu foi reeleito em 2004, ano em que foi preso pela Polícia Federal juntamente com Duda Mendonça, o ex-marqueteriro do presidente Lula, numa rinha de galos, atividade considerada crime ambiental no Brasil.

Sempre pelo PT, Jorge Babu é eleito deputado estadual em 2006. O feriado de São Jorge, que era municipal, passa a estadual.

O deputado é acusado de chefiar um grupo de milícias que comandam algumas favelas da zona oeste do Rio de Janeiro. Em 2008, Jorge Babu é denunciado pelo Ministério Público por formação de quadrilha e extorsão e, em janeiro de 2009, é expulso do Partido dos Trabalhadores.

Mas - atenção, eleitores! - o santo do ex-deputado é forte. Babu já conseguiu se filiar a outro partido, o obscuro PTN (Partido Trabalhista Nacional) e ainda este ano voltará a disputar eleições. Vale lembrar que o irmão dele, Elton Babu, segue cumprindo seu mandato de vereador do Rio de Janeiro pelo PT.

Em ano eleitoreiro, de vez em quando é bom a gente parar e refletir um pouco sobre o passado recente dos nossos legítimos representantes e candidatos.

Mas enquanto o dia do escrutínio não vem... aproveitemos bem os próximos feriados de Tiradentes (quarta-feira) e São Jorge (sexta). Aos felizardos que conseguirem enforcar a quinta-feira de trabalho bem no meio das duas efemérides, desejo um bom feriadão.

E que todos os santos ajudem o nosso Rio de Janeiro, amém.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Cineminha básico em Santa Teresa

Conterrâneos cariocas, acordem! E tem que ser rápido, porque a nossa cidade está sendo tomada por forasteiros de todas as partes do globo. Turistas que não falam uma palavra de Português, nem tem a menor noção das diferenças existentes entre as Zonas Norte, Sul e Oeste, estão sabendo aproveitar as atrações da nossa cidade melhor do que a gente.

Percebi isso quando, na terça-feira passada, me armei de ânimo e coragem para ir ao cinema em Santa Teresa. A simples decisão de ir até lá me fez sentir uma estrangeira dentro de minha própria cidade: consultei cuidadosamente o mapa no Google, verifiquei a localização e o tamanho das favelas da redondeza, planejei levar uma bolsa pequena com a menor quantidade possível de coisas e indaguei sobre a existência de estacionamentos pagos. No final, resolvi pegar logo um táxi e eliminar boa parte das minhas inseguranças. Fui.

O filme que me fez sair de casa e atravessar metade da cidade nessa noite de semana foi o documentário sobre o poeta matogrossense Manoel de Barros, hoje com 93 anos de idade, dirigido por Pedro Cezar. Além da extraordinária qualidade da poesia desse homem do Pantanal, também me atraiu o título do filme, adorável:  "Só dez por cento é mentira". A crítica tem aplaudido sem reservas este  ótimo documentário, que aqui no Rio está em cartaz há várias semanas... mas somente naquela lonjura de cinema de bairro, onde Judas perdeu as botas e o bondinho faz a curva. Eu precisava ir lá conferir, antes que o filme saísse de cartaz.

Que bom que eu fui. Encontrei um Largo do Guimarães quase vazio, bem como a sala do cine Santa Teresa. Em compensação, o premiado documentário lotou minha imaginação com idéias novas. A riqueza da poesia de Manoel de Barros - forte, concreta, marota, sensível, engraçada - estimulou meus sentidos como poucos roteiros milionários de cinema são capazes de fazer.

Será que este homem existe mesmo... ou será que é invenção da mídia? "Tudo o que eu não invento é falso", garante o poeta, embaralhando meus neurônios. Não entendo muito bem, mas também não duvido nem um pouco.

Amei o filme. Sei que nem todo o mundo gosta de poesia e este documentário trata muito mais da beleza das palavras do que da biografia do homem que as escreveu,  numa linguagem singela e maluca que alguns chamam de "idioleto manoelês". Por isso não vou exortar ninguém a ir vê-lo. Este não é um filme para atrair multidões, mas posso garantir que aqueles que tiverem o coração aberto para o inusitado vão se deixar seduzir pelas palavras de Manoel de Barros, o escritor que mais vende poesia no Brasil.

Terminado o filme, lá estou eu de volta no largo vazio, bem no centro da boemia de Santa Teresa. Nos fins de semana aquilo ali fervilha, mas numa simples terça-feira à noite não há ninguém por ali.

"Ninguém"? Que estou dizendo? Ouço um rabo de conversa em Francês na calçada estreita. O casal de turistas passa por mim apressado e entra confiante no casarão antigo, decorado com cores alegres. Entro também - pourquoi pas? O ambiente é convidativo e o nome do restaurante, de uma imodéstia deliciosa: Sobrenatural.

Além dos franceses, nas mesas do restaurante vejo também um pequeno grupo de garotas em férias, um casal de pele muito alva falando Inglês e outro casal, de cores de pele contrastantes e continentes opostos, conversando na linguagem universal dos gestos. O garçom é um nordestino simpático que, de tão acostumado a ouvir os mais variados sotaques por ali, quase me toma por forasteira também. Logo se dá conta de que sou tão brasileira quanto ele, mas parece inteiramente convicto de que não moro aqui na cidade: "Da próxima vez que a senhora vier para o Rio, sugiro que prove a nossa moqueca." Mas eu quero mesmo é provar o arroz de brócolis com lula. E não me arrependo! Que delícia de prato, grande pedida.

Cadê os cariocas nas ruas da nossa cidade? Tudo bem, a questão da segurança não é fácil, eu sei. Mas talvez a gente esteja exagerando um pouco. Cada vez mais, diminuímos o raio da área em que circulamos no nosso dia a dia e a cidade acaba encolhendo a um nível quase provinciano.

Tive a curiosidade de ler algumas páginas dos guias turísticos que os viajantes estrangeiros consultam antes de vir à nossa cidade. Sabem o que o Guide du Routard diz de Santa Teresa? Que é "o Montmartre do Rio de Janeiro". No Frommer's, o bairro é definido com uma expressão urbano-chic: "uber-funky neighborhood". Os elogios são muitos. As recomendações com a segurança também estão lá, mas aparecem em uma seção introdutória, sem alarmismos. E os turistas de fora se sentem no direito de passear pela nossa bela cidade de um jeito que nós, cariocas, raramente ousamos fazer.

É claro que alguns desses turistas tornam-se vítimas da insegurança que assola o Rio de Janeiro - o noticiário dos jornais não nos deixa esquecer da triste realidade. Mas também, convenhamos, são muitas as histórias de turistas brasileiros que se tornaram vítimas da malandragem em outras terras.  Nem por isso desistimos de apostar na alegria quando atravessamos fronteiras.

Sugiro o seguinte aos meus conterrâneos cariocas: no próximo fim de semana, imaginem que vocês moram em outra cidade e resolvem tirar dois dias de férias para passear no Rio de Janeiro. Antes de sair, consultem o Quatro Rodas - ou outro guia turístico qualquer - , calcem um par de sapatos tênis velhos e confortáveis e caminhem pelas ruas da nossa cidade, de olhos bem abertos, como qualquer turista. Visitem Santa Teresa... o morro da Conceição... a velha Lapa... as igrejas barrocas do centro da cidade... Bon voyage! Have a nice trip! Nós também merecemos. 


(Eu sei, eu sei: agora não dá para subir o morro do Corcovado, que vai ficar interditado pelos próximos seis meses por causa dos estragos terríveis da chuva. Deixemos esse passeio para as próximas "férias"!)

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Cabelos vermelhos

Que susto estranho levei agora há pouco, com a notícia da morte da artista francesa Jeanne-Claude, a extravagante parceira de vida e de estripulias artísticas por esse mundo afora de outro artista não menos extravagante, o búlgaro Christo. O casal não usava sobrenome e assinava suas obras de arte a dois, assim mesmo, só com seus primeiros nomes: Christo e Jeanne-Claude. Curiosamente os dois nasceram exatamente no mesmo dia, mês e ano, como que predestinados um para o outro: 13 de junho de 1935. Eles ficaram famosos por suas instalações monumentais - todas adoravelmente estapafúrdias - em locais públicos, inesperados. O "empacotamento" do prédio do Parlamento alemão em Berlim, do Pont Neuf de Paris e a "envoltura" de algumas ilhas da Flórida são alguns exemplos da arte deste casal, que ainda hoje provoca tantas controvérsias.  


Minha surpresa com a notícia da morte de Jeanne-Claude vem junto com uma sensação esquisita de perda atrasada, porque ela ocorreu há mais de seis meses, no dia 18 novembro do ano passado... Meu Deus, como pode ela ter desaparecido do meu mapa, sem eu perceber? (Só fiquei sabendo da notícia triste quando li há poucos minutos o blog de Marcio Fonseca, dedicado à divulgação de artes plásticas - ando meio desatualizada, certamente!) 


Mas quando penso na figura ousada e marcante, por quem tive a sorte de passar perto algumas vezes no Central Park e no Metropolitan Museum de Nova York, durante o período da instalação do The Gates em fevereiro de 2005, me dá vontade de rir. Na época eu morava a poucas quadras dali e pude acompanhar com um entusiasmo quase infantil todas as etapas daquela instalação ao longo de inúmeras semanas que me pareceram intermináveis. Sob qualquer pretexto, eu arrumava um jeitinho de passar pelo meio do parque e dar uma espiada no progresso das obras, desde as primeiras marcas de giz no asfalto, indicando onde cada poste seria cuidadosamente fixado (sem necessidade de perfurar o solo, para não deixar qualquer marca no meio ambiente quando a instalação terminasse), até o oba-oba do tão esperado dia da inauguração oficial, com o desamarrar de cada "gate" cor de laranja, num belo contraste com as cores do inverno novaiorquino. Esta foi com certeza a instalação artística mais ousada e empolgante que eu tive a chance de ver. 


Tão fascinante quanto os próprios "gates" era observar os rostos das pessoas que circulavam por baixo daquelas estruturas: quanta alegria... quantos sorrisos contagiantes, de todas as idades, etnias, procedências, níveis culturais! A gente caminhava (ou será que dançava?) por baixo daquelas estruturas metálicas e "bandeiras" ao vento com o coração leve como o das crianças. A sensação era de que a gente estava flutuando dentro de um sonho. Absolutamente surreal.


Depois de inaugurada, a instalação permaneceu mais duas semanas no Central Park, alegrando todo o mundo que por ali passava, a qualquer hora do dia ou da noite. A cada momento aqueles imensos estandartes cor de laranja assumiam uma personalidade diferente, de acordo com as condições do tempo: alegres quando coloridos pelo sol, ensimesmados quando molhados de chuva, leves como a neve que caía, melancólicos como a neve derretida, novamente alegres em contraste com o azul vibrante do céu...


É impossível pensar nos "gates" sem me lembrar dos cabelos vermelhos da Jeanne-Claude, tão divertidos e esvoaçantes quanto. Desconfio mesmo que ela se foi deste mundo colhida de surpresa por um pé de vento, num voo mágico em direção ao céu. Imagino-a voando e rindo às gargalhadas com aqueles cabelos vermelhos ao vento, encantada com aquela que deve ter sido a mais magnífica de todas as suas instalações.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

"Rio... mas também posso chover"

A frase genial é do Jards Macalé e saiu hoje estampada na primeira página do Globo, na arte do não menos genial cartunista Chico Caruso:
Rio, mas também posso chover. 

Há menos de três dias o céu desabou sobre o meu Rio de Janeiro, trazendo deslizamentos de terra, destruição e morte por todos os lados da cidade. Fiquei dois dias inteiros sem me atrever a sair de casa, alarmada com a fúria da tempestade tão inesperada quanto cruel, em pleno outono carioca.



Ontem saí da toca: fui rapidinho ao banco, corri aqui e ali, tratando de fazer o essencial e voltar logo para casa. Cheguei justo no instante em que uma nova chuva torrencial resolveu cair sobre nossas cabeças já encharcadas.

Hoje cedo, o sol reapareceu no céu, mas não no meu coração. Enquanto lia o jornal, não conseguia conter as lágrimas diante de tanto sofrimento e tantas perdas alarmantes em nossa cidade. Apesar disso, ainda consegui sorrir um pouco quando dei com aquele cartum da dupla Chico-Macalé. E meu otimismo incurável arranjou logo um jeito de inverter o astral da manhã:

Posso chover... mas também Rio!

Resolvi sair à rua de bicicleta. Tinha algumas pequenas coisas a fazer, contas a pagar. Pois iria fazer isso tudo com muita disposição, desafiando as nuvens que ainda insistem em ir e vir por este céu, roubando a nossa tranquilidade.

No caminho, passei pelo clube de regatas do Botafogo, ali na curva do Calombo da Lagoa. Quem está no nível da rua não consegue ver grande coisa, mas no nível da água da lagoa o estrago foi grande: o píer,  destroçado com a força do vento, vai ter que ser totalmente reconstruído.


Mas nem por isso o pessoal do remo perdeu o bom humor. Ao lado do timoneiro César e de outros companheiros do Botafogo que tentavam reorganizar a casa, retirando a lama do chão, lavando remos e barcos, o instrutor Bruno me comunicou, abrindo um grande sorriso: "Tivemos muita sorte, não perdemos nenhum barco!"

Carioca que se preze é assim mesmo: 
não perde a chance de sorrir. 
Segunda-feira estarei lá, 
novamente remando com a turma toda ao nascer do sol!



sexta-feira, 2 de abril de 2010

Luxo tropical


Saí cedo de casa para fazer minhas compras de Páscoa no hortomercado aqui perto:  frutas, cogumelos, ovos caipiras e verduras frescas. De quebra, uma pequena orquídea cultivada na região. Um verdadeiro luxo tropical.

Toda sexta-feira de manhã vou até lá reabastecer a casa e alimentar meu coração brasileiro. Adoro ir ao hortomercado. Tem jeito de Brasil bom, cheiro de terra e gosto de comida feita em casa.

A conversa ao redor das bancas fartas, com tantos produtos frescos e coloridos, me dão a sensação de que o nosso planeta azul (incrível!) despertou em paz:



"Bom dia! Hoje as batatas baroas estão bem bonitas!" 

"A senhora não quer provar um gominho dessa tangerina? Está uma delícia!" 


"Vai querer pastel de quê? Só um minutinho, que já está saindo um bem quentinho..."




"Hoje os caquis estão ainda mais doces do que na semana passada!"

"Se não tiver dinheiro trocado, não tem importância: a senhora me paga na semana que vem."


Gente boa e trabalhadora, que nunca aparece nas manchetes dos jornais, mas que faz parte do meu cotidiano e do Brasil mais concreto e bonito que eu conheço.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

A vida é feita de amigos (continuação de ontem)

Este quadrinho está lá, pendurado na parede da minha cozinha. Foi feito a mão pela minha amiga Juca. Todos os dias olho para ele e fico feliz, pensando na importância da gente ter amigos, mesmo quando se está geograficamente distante.

Amigo é coisa pra se guardar
do lado esquerdo do peito...